Sobre
o Centro

O Centro Histórico e a História do Centro

A ocupação inicial de Porto Alegre data de 1752, com a chegada dos casais açorianos ao Sul do Brasil. Em 1773, a cidade ganhou status de capital, mas até o final do século XIX ainda se manteve como um centro urbano pouco desenvolvido, contando com um conjunto edificado de pouca expressão e arruamentos estreitas e carentes de infraestrutura. 

No primeiro quarto do século XX, a cidade passou por um salto de desenvolvimento que visava proporcionar ares de metrópole à modesta capital. Em um curto período, o Mercado Público ganhou um segundo pavimento e foram construídos o Palácio Piratini, a Biblioteca Pública, a Delegacia Fiscal, o prédio dos Correios e Telégrafos, o Arquivo Público e o Cais Mauá – operação que constituiu o conjunto de maior relevância patrimonial da cidade.

Um segundo movimento de modernização, iniciado no final dos anos 20, teve por base obras de estruturação urbana. Entre elas se destacam a abertura das avenidas Júlio de Castilhos, Borges de Medeiros e Alberto Bins; o Viaduto Otávio Rocha; e as praças XV de Novembro, Otávio Rocha e Dom Feliciano. Neste período surgiram os principais cinemas da cidade e diversos investimentos privados como o Banco do Comércio, a Galeria Chaves, a Livraria do Globo e o Hotel Majestic – além de diversos prédios residenciais e comerciais. 

As décadas de 50 e 60 se caracterizaram por um importante processo de verticalização do Centro, responsável pela perda de boa parte de seu patrimônio construído. O aumento da densidade populacional, a concentração do comércio e dos serviços especializados e a limitação do sistema viário existente levaram a uma situação limite do ponto de vista do tráfego, com a disseminação desenfreada de terminais do transporte coletivo.                                                  

 

Os anos 1970 e o início do declínio 

Os anos 1970 se notabilizaram por expressivas obras viárias e de saneamento, retratadas pela execução de uma grande área de aterro ao Sul da península do Centro e pela construção de viadutos, da 1ª Perimetral, da estação rodoviária, do muro de contenção de cheias e, mais tardiamente, do Trensurb – que consagraria a separação entre o cais e a cidade, afirmando o domínio da visão pragmática e voltada para resultados que prevalecia na época.

Neste período, o Centro começou a sofrer as consequências da transformação de Porto Alegre em uma – pequena – metrópole, num processo que se acentuou nas décadas seguintes, levando, no final dos 1990, ao completo domínio de suas vias pelo comércio informal e a uma significativa degradação dos espaços públicos. O resultado direto desse processo foi a espiral de declínio retratada pela evasão de 30% de sua população e pelo descrédito de sua imagem, que passou a ser pautada pelas condições de abandono e insegurança. 

Anos 1980 – 2000: os primeiros movimentos de recuperação

As primeiras iniciativas de reabilitação do Centro, nos anos 1980, tiveram resultados limitados e se mostraram incapazes de enfrentar a tendência de declínio sistêmico estabelecida na região e o ônus da imagem desgastada, muito pior do que sua própria realidade. A modernização do Chalé da Praça XV não prosperou em função da proximidade com o maior núcleo de concentração do comércio informal. O Viaduto Otávio Rocha foi recuperado, mas logo voltou a se deteriorar, recebendo frequentes pichações e ataques de vândalos. A Rua 24 horas não se efetivou como esperado e o chamamento da iniciativa privada para o processo de recuperação do Centro esbarrou nas tradicionais dificuldades de articulação inerentes ao poder público.

Apesar dos insucessos do período, há um importante legado deixado por projetos que levaram adiante propostas ousadas. Ainda que posteriormente tenha entrado em um processo de decadência, o Largo Glênio Peres – esplanada aberta para visualização do Mercado Público – representou um marco de urbanidade ao transformar o maior terminal de ônibus da área central em espaço de convívio, tornando-se um local tradicional para a realização eventos. 

A Casa de Cultura Mário Quintana, oficialmente inaugurada em 25 de setembro de 1990, e o Solar dos Câmara se tornaram âncoras de atração de público externo. A reforma do Mercado Público, ainda que questionada pela mudança de sua ambiência interna, deu sobrevida comercial ao equipamento e qualificou suas operações. Já a transformação da Usina do Gasômetro em centro cultural, ocorrida em 1991, representou um marco da bandeira de recuperação patrimonial.

Projeto “Viva o Centro” (2005/2012)

O período entre 2005 e 2012 constitui um segundo estágio no processo de reabilitação do Centro Histórico, registrando a recuperação de suas principais praças e prédios históricos, a criação de espaços culturais e o equacionamento da questão do comércio informal. A ações implementadas mudaram a imagem da região e tiveram como reflexo a atração de novos investimentos e o incremento populacional.  

Do ponto de vista da recuperação do patrimônio histórico, esse foi o período em que Porto Alegre dispôs da maior capacidade de investimento, tendo em vista os recursos federais proporcionados pelo Projeto Monumenta. Foram restauradas todas as edificações do conjunto tombado pela União, recuperando um passivo acumulado ao longo de décadas. Só no eixo entre a Praça da Alfândega e a Praça da Matriz, o Projeto Monumenta recuperou o Pórtico Central do Cais Mauá, a Avenida Sepúlveda, o MARGS (antiga Delegacia Fiscal) o Memorial do RS (antiga sede dos CORREIOS), o Museu Hipólito José da Costa, a Biblioteca Pública, o Palácio Piratini, a Pinacoteca Rubem Berta, a Catedral Metropolitana, o Monumento a Júlio de Castilhos e a própria Praça da Alfândega. Através do fundo para imóveis privados foram recuperados mais de 50 prédios, dentre os quais a Igreja das Dores, o Edifício SULACAP, o Edifício Tuyuti, a Igreja Anglicana, o Clube do Comércio e o Hotel Praça da Matriz.

Das intervenções capitaneadas pelo Município, mais relevante foi construção do Centro Popular de Compras, que absorveu os 800 pontos de venda do comércio informal que ocupavam as principais vias do centro da cidade. A liberação do espaço público gerou um grande impacto para o comércio local, impulsionando suas vendas em aproximadamente 30%. 

A retomada das ruas alterou a percepção da população em relação ao Centro e devolveu credibilidade ao município, criando um ambiente extremamente favorável para a realização de parcerias com a iniciativa privada, como nos casos da ampliação do Chalé da Praça XV, da reurbanização do Largo Glênio Peres, da Praça Revolução Farroupilha, da conclusão da Cinemateca Capitólio e da criação do Caminho dos Antiquários. 

Houve, também, uma intensa campanha para a renovação das áreas verdes do Centro que incluiu suas principais praças. A estratégia contou com aporte de recursos federais e do município, de parcerias e através da destinação de compensações decorrentes de Termos de Ajustamento de Conduta vinculados ao meio ambiente. 

Os exemplos de recuperação do patrimônio provocaram outros agentes públicos a restaurarem suas edificações e, em muitos casos, destinando-as a atividades vinculadas a cultura. Neste caminho foram recuperados o Palácio da Justiça e instituídos o Memorial do Legislativo, o Memorial do Ministério Público, o Centro Cultural Érico Veríssimo e iniciada a obra do Centro Cultural da Caixa Federal. O Anexo Multipalco do Teatro São Pedro teve sua primeira fase inaugurada em 2010 e o Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB) concluiu a reforma e restauração de sua sede, que inclui espaços de exposição e eventos.

Em 2009 foi concluído o Plano de Diretrizes para Reabilitação do Centro, formatado com a participação de várias entidades representantes de moradores, comerciantes, prestadores de serviços, instituições públicas e privadas, empresariado e universidades. Paralelamente, foram criados vários movimentos objetivando a mudança de imagem da região. Em 2008 foi aprovado projeto de lei que alterava o nome do bairro para Centro Histórico. A ação teve uma enorme importância em termos de autoestima, mudando a percepção sobre o território e relacionando sua identidade a valores que começavam a ter visibilidade. O Caminho dos Antiquários criou uma feira semanal de antiguidades em área que concentrava várias lojas do ramo, surpreendendo pela possibilidade do Centro Histórico em oferecer ambientes seguros para exposição de objetos de valor em plena via pública. 

Criado em 2006, o projeto “Viva o Centro a Pé” teve como objetivo oportunizar a visitação dos principais conjuntos de preservação patrimonial em caminhadas guiadas por jornalistas, escritores e especialistas das áreas da história, artes e arquitetura. Ao longo dos anos, o projeto gerou uma constante pauta positiva nos mais diversos meios de comunicação, divulgando uma riqueza desconhecida para a maior parte da população. 

As melhorias implementadas estimularam a recuperação e restauração de prédios privados e a abertura de empreendimentos de uma qualidade há muito não vista na área central. Edifícios como a Galeria Chaves, Livraria do Globo, das Lojas Guaspari e do Cine Carlos Gomes foram restaurados para abrigar novos negócios e vários prédios comerciais foram modernizados.  

Por um período, o Centro Histórico passou a ser visto como alternativa de moradia para uma parcela da população. De acordo com o Censo de 2010, o Centro Histórico registrou um aumento de 6% em sua população, rompendo com um decréscimo populacional de três décadas e aparecendo como o único bairro estabelecido a apresentar crescimento no período. 

2013 – dias atuais 

A partir de 2013 o processo de recuperação do Centro Histórico perdeu boa parte de sua sustentação e deixou de ser uma prioridade da administração, esvaziando-se pela falta de governança e de uma visão sistêmica capaz de transcender governos. O término do Projeto Monumenta diminuiu consideravelmente as ações de recuperação do patrimônio histórico. As dificuldades econômicas que o país atravessou neste período puderam ser observadas pela redução de investimentos privados, pela perda de parcerias e pelo retorno do comércio informal aos principais logradouros. Recentemente a situação se tornou ainda mais crítica pela acentuação da crise econômica e pelos efeitos da pandemia, diminuindo a circulação de pessoas e afetando a ocupação dos prédios de escritórios, com efeitos diretos para os setores de alimentação, hotelaria e do comércio em geral.   

Apesar das perdas e de todas as dificuldades, a atual situação do Centro Histórico não é, nem de longe, comparável com o quadro vivido nos anos 1980 e 1990. Há um lastro considerável de investimentos, entre recursos públicos e decorrentes de parcerias com a iniciativa privada, que facilmente superam a casa dos R$ 200 milhões. As obras de recuperação do patrimônio histórico e as melhorias realizadas no espaço público permanecem em sua grande maioria, assim como os novos espaços culturais criados nas ultimas décadas. 

Sobretudo, há em andamento uma série de projetos e obras com conclusão prevista para os próximos anos, como: as obras do Quadrilátero, que reestruturão as principais vias do comércio de varejo do Centro Histórico, humanizando a relação do pedestre com o tráfego viário, e a reurbanização dos calçadões para pedestres das ruas dos Andradas e Uruguai; a revitalização da Usina do Gasômetro e da Praça da Matriz; o contrato para a iluminação cênica de 39 prédios históricos e a renovação de todo parque de iluminação pública, a revitalização do Mercado Público e, em enquadramento de recursos para execução, a obra de recuperação do Viaduto Otávio Rocha.

Outro tema fundamental e decisivo para a estratégia de desenvolvimento do Centro Histórico se refere aos projetos de renovação urbana que vizinham seu território: ao Norte, o Projeto 4º Distrito; ao Sul, o Projeto Orla POA. Conectando os dois, o Projeto Cais Mauá, que estabelecerá uma interface de 2 quilômetros com o Centro Histórico em sua região mais sensível e dotada de oportunidades, apta a ser impulsionada pela renovação em escala proposta pelo projeto.

O Projeto 4º Distrito envolve a recuperação de bairro de origem industrial extremamente bem localizado, ao lado do Centro Histórico e do bairro Moinhos de Vento e junto aos principais acessos à região metropolitana e ao Aeroporto Salgado Filho. Esvaziado em função do declínio das atividades antes existentes, a região é alvo de projeto que propõe a criação de um polo de oportunidades para moradia e novos negócios. 

O Projeto Orla POA envolve um conjunto de oportunidades de investimento que têm potencial para redesenhar a imagem da cidade e influir em sua própria vocação, dando ao setor do turismo uma dimensão não imaginada. Neste sentido, a condição de capital dotada de importante acervo histórico, a proximidade com Gramado, – segundo maior destino turístico do país –, e as possibilidades de exploração de sua frente de água junto ao Guaíba são fatores extremamente relevantes.  

O potencial desta perspectiva pode se confirmar pelas recentes inaugurações do Parque Moacyr Scliar e Praça Julio Mesquita (Trecho 01 do Parque da Orla) e do Projeto Embarcadero, que mudaram o centro de gravidade das atenções para esta região da cidade. A estes se soma, ao longo de 8 quilômetros de orla, atrações já existentes como o Memorial Prestes, o Shopping Praia de Belas, o parque Marinha do Brasil, o Rooftop do Hotel Millenium, o Estádio da Beira-Rio, o Museu Iberê Camargo, o Barra Shopping e o Mirante da Estação Elevatória do Arroio Cavalhada. Em fase de execução, ou prontas para licitação, a reforma da Usina do Gasômetro, a Concessão do Parque da Harmonia, os Trechos 02 e 03 da Orla, a Torre de Negócios do Sport Club Internacional e o Pontal do Estaleiro.